quarta-feira, 2 de julho de 2014

Dos caminhos percorridos



Prados, 13 de junho, de 2014.

A apenas alguns dias do início das férias me vejo em uma nova despedida: das pessoas queridas que aqui em Prados conheci. Esta é uma “despedida”, sim, inevitável, devido ao caminho que ainda tenho que seguir, mas junto vem o desejo de novo reencontro, breve, que seja! Confesso que ainda não comecei “embalar” meus pertences, nem tampouco a arrumar as malas ou a encaixotar tudo que preciso para meu novo destino: Belo Horizonte. Confesso que esta semana meus olhos se encheram d’água por diversas vezes, não querendo partir, mas precisando seguir viagem.

Neste semestre a vida em Prados foi diferente de tudo o que eu estava acostumada, a rotina foi outra. Esta cidade ainda tem um pedacinho do céu: vejo isso no bom dia que recebi pelo caminho de pessoas que não me conheciam, das portas e janelas abertas de frente para a rua sempre nos convidando a entrar, da pracinha cheia nos finais de semana e dos famosos bailes da UCA...

O caminho para chegar até aqui não foi fácil: foram anos de estudo, muita abdicação e esforço. Muitas vezes, abri mão de alguns desejos para que pudesse realizar o sonho de tornar-me médica. E tornar-se médica, para mim, não significou nunca estudar para tirar boas notas na faculdade e passar para o período adiante. Notas, apesar de necessárias, não nos fazem ser melhor, não prova o nosso conhecimento e técnica. Para sermos completos, precisamos (além de muito estudo e disciplina), humildade para aprendermos com os que estão a nossa frente (independente da profissão), força de vontade para aprender com os erros, paciência e o principal: o amor ao ser humano. E este é o amor que que me faz querer sempre aprender mais para ajudar sempre mais.

Um dia antes da reunião em que escolhemos a cidade, a qual devemos vir para o nosso estágio de saúde coletiva (o internato rural), já estávamos “estressadas”, pois apesar de sempre querer estar nesta etapa dos estudos (e tão mais próximo à formatura) tínhamos receio de onde poderíamos chegar (receio principalmente por não sabermos como poderíamos ser recebidos, com quem encontraríamos, onde ficaríamos...). Muitas vezes, em conversa com Julyanna (meu par de internato), principalmente na véspera da escolha (que dura cerca de dois minutos por dupla) dizíamos “vamos rezar a Deus para irmos para uma boa cidade”. E Deus atendeu as nossas preces e nós duas chegamos a conclusão (após algum tempo morando em Prados) que não foi a gente que escolheu esta cidade, mas o contrário (e com a Mãozinha de Nosso Senhor): Prados nos escolheu. Talvez por isso os seis meses com vocês, pessoas especiais, passaram rápido e antes mesmo de nossa mudança já sentimos saudade.

Eu queria então falar de algumas raízes e asas. Um sorriso acanhado do primeiro , um abraço tímido do segundo, um ar estabanado do terceiro, uma gargalhada do quarto. Não são somente quatro pessoas, são algumas mais. Muito mais: são pessoas maravilhosas que conheci no caminho da Quebra Castanha, no Posto de Saúde e na Santa Casa.

Daqui levo alguns amigos roubados, conquistado com o tempo ou com a convivência. Levo os sorrisos e as alegrias de vocês em minha bagagem. Levo aprendizados, como por exemplo, como podemos aproveitar a vida de forma simples, dando valor aos sentimentos. Levo choros também, choros estes de saudade antecipada. Levo desejos de um futuro bom a todos que por mim passaram e que me acrescentaram e me ensinaram.

Eu queria dizer a vocês uma benção irlandesa a qual muito gosto, um mínimo pedacinho diz mais ou menos assim: “e até que de novo nos vejamos, que Deus os guardem na palma de Sua mão”. Mas disso eu também não tenho dúvidas: vocês tem um lugar no céu e Deus sempre estará olhando por cada um de vocês.

As despedidas doem. Contudo, somente machucam quando temos a certeza de que o momento vivido foi bom. São, antes de mais nada, lembranças antecipadas, porque a partir de amanhã não nos veremos diariamente. E então temos um outro recomeço. Temos novamente que respirar e rearrumar a casa, para que a ausência, antes tão presente, seja uma lembrança doce e boa. Por isso, lembro ainda que “tem coisas que não queremos que aconteça, mas temos que aceitar. Coisas que não queremos saber, mas temos que aprender. E pessoas que não podemos viver sem, mas temos que deixá-las partir." Por esse motivo: não é exatamente da cidade de Prados que vou sentir saudade. Não. Na verdade, são as raízes que plantei aqui que me farão sentir falta.

E desse dia em diante, prometo que quando possível for e a saudade tornar-se insuportável, voltarei aqui, para a cidade que também torno-se o meu lar para mais uma vez poder reencontrá-los.

Com todo carinho do mundo, meu muito obrigada por vocês terem me recebido com muito amor. Saibam que vocês carregam o meu coração e que serei eternamente grata pela acolhida que aqui encontrei.

Um beijo grande,

L.


Esta foi uma carta que escrevi para a cidade de Prados - MG, que me acolheu por seis maravilhosos meses. Neste tempo pude colocar em prática não só os conhecimentos médicos, mas os valores que me foi passado desde criança. Foram seis meses inesquecíveis. Foram dias que levarei onde a Medicina me chamar.